"Os dias magros de teimosia. Essa era a palavra.
Teimosia: Arturo Bandini diante da máquina de escrever dois dias seguidos,
decidido a ter sucesso; mas não funcionou, o mais agudo ataque de teimosia de
sua vida, e nem uma linha, só uma palavra repetida, de cima a baixo, a mesma
palavra: palmeira, palmeira, palmeira, uma luta de morte entre a palmeira e eu,
e a palmeira ganhou: olha lá ela balançando no ar azul, farfalhando doce no ar
azul. A palmeira venceu depois de dois dias de luta, e eu rastejei pela janela e
me sentei aos pés da árvore. O tempo passou, um momento ou dois, e eu caí no
sono, formiguinhas marrons fazendo farra nos pelos das minhas pernas."
(Trecho do livro)
Descobri a existência do escritor John Fante (1909-1983) através de Charles Bukowski (1920-1994), não por
coincidência outro Escritor e Poeta. Bukowski, quando jovem, frequentava a
biblioteca de Los Angeles - segundo ele, somente quando não tinha dinheiro para
bebida. Cansado de ler os velhos escritores ditos "medalhões",
resolveu procurar algo que prestasse entre os novos e desconhecidos, ou mesmo
em outras áreas de leitura que não a Literatura (até a seção de Cirurgia ele
leu), um dia, deparou-se com um exemplar do livro "Pergunte ao Pó"
numa preteleira. Segundo ele, o livro era escrito "com as tripas e com o
coração", e influenciaria seu modo de escrever permanentemente.
O livro conta a história de Arturo Bandini, filho de imigrantes que veio para Los Angeles com uma mala contendo exemplares de uma revista literária com seu único conto: "O cachorrinho riu".
Bandini é um jovem de vinte
anos que pensa o tempo todo em tornar-se um grande escritor
de fama e glória, mas vive num Hotel barato, à base de laranjas, e enrolando seus cigarros com papel higiênico. Quer escrever sobre a
vida e o amor, mas não tem muita experiência com a coisa. Ele sabe disso e uma
das marcas da escrita de Fante é que o personagem possui um senso de
autocrítica bastante evidente e articulado dentro do texto.
Vivendo na Los Angeles dos anos 30, um dia entra num
bar para beber um café ordinário, e conhece a Garçonete Camilla Lopez. Ela é mexicana e Bandini fica instantaneamente apaixonado – o que
não admite. Daí, a hierarquização das relações e o preconceito existente na
sociedade da época são evidenciados no trato que o autor dá ao romance entre
Camilla e Arturo: a relação de amor-ódio entre eles, que se intensifica. A
garçonete é apaixonada por outro cara, que também aspira ser um escritor. Ela pede
ajuda a Bandini, para que aconselhe o rapaz. Mas ainda assim uma relação entre
eles se desenvolve e dá voltas e reviravoltas no enredo.
John Fante escreve com o coração e as tripas, como
Bukowski relata: a estrutura textual é bem amarrada e clara, como se as
palavras fossem entalhadas na página. Os capítulos podem ser separados da obra
e ainda assim possuem uma estrutura lógica, como se fossem pequenos contos. É uma
leitura gostosa, em que você termina o capítulo louco pra ler o próximo.
A Editora José Olympio finalmente relançou o
clássico de John Fante, com tradução de Roberto Muggiati. Já
não era sem tempo e a tradução é primorosa e atual. O livro pode ser encontrado
AQUI.
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